13 de fevereiro de 2013

Poema Melancólico a não sei que Mulher

Dei-te os dias, as horas e os minutos
Destes anos de vida que passaram;
Nos meus versos ficaram
Imagens que são máscaras anónimas
Do teu rosto proibido;
A fome insatisfeita que senti
Era de ti,
Fome do instinto que não foi ouvido.

Agora retrocedo, leio os versos,
Conto as desilusões no rol do coração,
Recordo o pesadelo dos desejos,
Olho o deserto humano desolado,
E pergunto porquê, por que razão
Nas dunas do teu peito o vento passa
Sem tropeçar na graça
Do mais leve sinal da minha mão...

Miguel Torga, in 'Diário VII'

Soneto para um Gelado Cornetto com sabor a moranço ranço


Quero impor auto disciplina de vontade férrea:
Reduzir todo o desejo a uma percepção etérea
De algo que um dia cá esteve e que se sumiu,
Um sonho de castelo de areia que um dia ruiu.

Quero uma apatia austera de inócua fertilização:
Evasão eterna a todos os momentos de ilusão
De geração espontânea ou por outra forma impingida,
Instante irracionais de concretização fingida.

Quero auto disciplina apática e fleumática,
De certo modo abstrata e pneumática:
Maquinal e fria de metal.

Quero reserva e contenção, não atenção,
Por forma a subsistir a frustração
De entender tudo mal.

Uma pequena homenagem


Deu-me para escrever isto a esta hora da manhã, depois de me lembrar do excerto que se segue, em baixo.

E era ver-te sentir o ouro nos olhos
enquanto a urze me pica a mão,
nos meus ombros o peso do mundo
e nos olhos fechados o negro profundo.
E enquanto desço os cotovelos ao chão
confias no sol em que dobras as pálpebras no calor
quente, dourado; e em mim o negrume
que me faz arrancar a erva aos molhos,
aos molhos de uma mão de cada vez.
E o dourado que sentes, o calor que vês
é o som dos pinheiros a voar ao vento,
as agulhas que picam como as palhas na mão
de olhos fechados, ofegantes, o nosso alento
ardendo como o sol que te brilha nos olhos.
E o negro que é negro como nunca vi,
negro como as neves brancas são brancas,
alvas como o teu pescoço que imagino
de olhos fechados, imerso eu no escuro,
tu no ouro.
E de repente, no negro, o vazio;
e no vazio, a queda, e na queda o fim;
e no fim, o negro  e o dourado em comunhão;
e, na comunhão, um mundo sem chão,
a eternidade finita no tempo da terra,
um momento cruel de candura parado na guerra.


"Then there was the smell of heather crushed and the roughness of the bend stalks under her head and the sun bright on her closed eyes and all his life he would remember the curve of her throat with her head pushed back into the heather roots and her lips that moved smally and by themselves and the fluttering of the lashes on the eyes tight closed against the sun and against everything, and for her everything was red, orange, gold-red from the sun on the closed eyes, and it was all that color, all of it, the filling, the possessing, the having, all of that color, all in blindness of that color. For him it was a dark passage that led to nowhere, then to nowhere, then again to nowhere, once again to nowhere, always and forever to nowhere, heavy on the elbows in the earth to nowhere, dark, never any end to nowhere, hung on all time always to unknowing nowhere, this time and again for always to nowhere, now not to be borne once again always and to nowhere, now beyond all bearing up, up, up and into nowhere, suddenly, scaldingly, holdingly all nowhere gone and time absolutely still and they were both there, time having stopped, and he felt the earth move out and away from under them." 

Ernest Hemingway in "For whom the Bell Tolls"

4 de junho de 2012

Para quê perguntar se não queres saber?


Soluço somente a solidão das conversas de circunstância,
Um acto de erosão, um testemunho de auto comiseração.
Perguntam perguntas cuja resposta carece de substância,
Preocupação plausivelmente pungente e incriminatória,
Pois o acto de perguntar é misericordioso na sua essência
- Acção desculpabilizante e inerentemente auto satisfatória,
A vontade dos interlocutores é nula na sua impaciência,
Que ardas no reino da boa intenção, pois vazia és de razão…
Se, pergunta, existes como demonstração frívola de preocupação
Queda-te isolada no eterno etéreo esotérico da tua ciência
Máscara de desinteresse, nada mais és que desafio e ilusão.

18 de abril de 2012


Lá fora cai chuva, e poupo desde já a metáfora;
Não cai como cá, cai, sei lá, como caiu tanta vez.
Importa perguntar o que cai cá, porque é indefinido,
É uma espécie de viagem, de diáspora;
Vai  à bolina, cai sem se mexer, cai com  altivez,
Estatela-se disforme formando um finito sustenido... som.
Se cai num baque, depressa se levanta e apruma o fraque.
Pigarreia e recompõe, que a chuva quando cai não tem tom,
Suprime-se opressora da sua individualidade,
Desvanece-se no conjunto que forma a sua totalidade
Indivisível, una e unidireccional -
Aguarda que o vento a sopre, como a soprou outra vez
Ciclica e quase igual, variando na intensidade
Com que cai, cai, aqui e ali, em surdina mas sem surdez.

17 de abril de 2012

A ausência de transparência é virtude travestida de violência;
Um apagar de marejar, e sempre a sarnar o fundo da cabeça, qual pestilência
Que coça, que manieta a consciência - condiciona e denota formoso perfume
Mascarado de queixume, Sempre, sempre, sempre em repetição.
A ti te nomeio, maldição.

É auto imposto, refilo acusatório!
São interrogações em monólogo e num tom interrogatório,
Defino estratégias de um prólogo: algo indefinido e etéreo que não consigo precisar
Que ecoa na cabeça em estéreo e que nunca acaba de começar.
A ti te denomino de confusão.

Reinvento-te! Revejo-te e recrio-te,
Como se a imposição de um prefixo não fosse mais do que um crucifixo
Uma carga que estou habituado a carregar, e assim desisto!
Alegremente, assobiando pró lado, espécie de refluxo em sufixo
Até que reapareces, sempre uma espécie de imprevisto…
Por fim te chamo desilusão.

24 de janeiro de 2012

Sombras

A projecção de volumes no espaço recortados no restolhar de uma alegórica assunção da realidade que vagueia entre uma verdade e a distorção efémera de momentos perenes; parede de papel de arroz retro-iluminada que comunica imagens que o cérebro re-associa e distorce à interpretação mais conveniente e conivente com a própria imagética associada ao empirismo orgânico de sinapses múltiplas e comunicações intermodais de impulsos electromagnéticos.
É vento...
A imagem que assoma no som que se ouve, são recriações inéditas na sua espontaneidade, na verbalização humana de pensamentos desafogados, são linhas difusas que se separam em nada, que se reflectem e que difundem o mundo sob a percepção de um cérebro que interpreta.
Mais... não!
Pretende-se um olhar objectivo, liberto de constrangimentos racionais, que permita uma transmissão concreta e o mais aproximada da realidade. 
É aqui, neste preciso momento, se encontra a maior dificuldade.
É no conhecer, no realmente conhecer algo que se apresenta, no libertar de preconceitos e juízos prévios, que vive a essência da realidade, na transposição do mesmo para papel, proporcional, correcto... ou não, nunca correcto, aproximado, num quase permanentemente adiado e ostracizado...
Nunca, ninguém se liberta da subjectividade inerente ao ser, a não ser  através de vias autistas, onde a realidade é focada e ampliada à falta de instrumentos de interpretação inatos.
Na verdade, no confiar desconfiando, refazendo, redesenhando, replaneando e acima de tudo na auto correcção constante presente neste estado de espirito de bom senso auto imposto; é que se encontram as respostas para quase todas as equações.
As sombras não deixam de ser manifestações filtradas da realidade.

17 de janeiro de 2012

Coisas do diabo...

Virtualidade soa a falsidade e a falsidade como não poderia deixar de ser soa a falso, mas com isso me contento... tem de ser! Na realidade, após as abjectas tentativas em que nada soava a gramaticalmente correcto, nem sequer a um português minimamente bem balbuciado, resumo a isto a minha experiência de comunicar com o resto do mundo, à excepção de tudo e todos, sendo que o resto do mundo na realidade se reveste de um individualidade exasperante concentrada num só ser. São coisas do diabo... 
Aguardam-se, esperançosamente, novos episódios...

25 de dezembro de 2011

Noite de Natal

Os vales negros da noite sarapintados de pontos reflexos
Espelhados celestialmente na noite fria, qual espelho etéreo
Um caminho que se obstina, iluminado a meia luz, desconexo
Sussurros de cães que ao longe manifestam o efémero.

É de noite e o ar está plano, previsível e pleno, frio mas confortante.

No escorrer gélido da água, no ressoar dos sinos consumidos
Na geada que cai na cama por cima dos lençóis
À luz que frincha pelas persianas de faróis
Sonho poemas não escritos e que jamais serão lidos.

21 de dezembro de 2011

Só porque faço anos e me apetece pedir desejos...


É na cara nova de sorriso aberto que me revejo
Nesses teus olhos castanhos de castanho esverdeado
Num jeito meio tímido e fechado como te percebo
No fogo desse cabelo de rubi que ensejo.
Em ti,
Sorrio...